sábado, 25 de junho de 2011

Um poema antigo que continua atual (infelizmente)

Plantação

                                  
O agricultor matou a fome com um naco de terra
e protegeu-se do frio com um cobertor de vermes.
Não tinha terra; agora, ele era a terra.
E, no buraco que a espingarda cavou em seu peito,
fincaram-se as raízes da miséria e do desespero.

Seu sangue, ainda quente, irrigou a lavoura
e fez brotar flores raquíticas
de frutos que não matam a fome.
Sua carne, mesmo que pouca, adubou as plantas
e deu-lhes a palidez mórbida
do triste fim de seu cultivo.

Novos agricultores vão chegando
para também fincar raízes naquele latifúndio.
Novos agricultores vão chegando
para saciar a mesma fome de terra.
Novos agricultores vão chegando;
são iguais na busca e também no destino
de cair sempre nas garras da mesma fera.

E, a cada novo estampido de tiro,
vê-se mais uma semente
na plantação de homens.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Soneto da devassidão
                                                                                                                                               
Enquanto a noite vai chegando ao apogeu,
em teus lençóis os meus pudores eu afasto
e sigo em busca do deleite nada casto
que só teu corpo pode dar ao corpo meu.

Na tua cama sou amante, fera, deus!
E penso, enquanto em tua carne faço pasto:
“Nenhum dinheiro, certamente, é melhor gasto
que o empregado nos fingidos gozos teus.”

Mas se o tesão ao fim da transa ainda me engana,
chegando mesmo a disfarçar-se de ternura,
prometo, sou capaz até de uma loucura:

antes que tenhas posto a roupa e pego a grana,
eu te direi, com meu orgulho de poeta:
- Fiz um soneto à minha puta predileta!